sábado, 7 de junho de 2014

Platonismo e Aristotelismo em Bizâncio (parte II)

Continuação do post anterior, do livro de Basil Tatakis Christian Philosophy in the Patristic and Byzantine Tradition

1) Os comentadores bizantinos de Aristóteles --> É agora tempo para nós de retornarmos a Bizâncio e inicialmente dizer poucas palavras sobre os comentadores bizantinos de Aristóteles. O mais importante entre os antigos comentadores é João Philoponus, cujo trabalho foi continuado pelos seus estudantes Estevão de Alexandria, David o Armênio e Elias. Eles seguiram a tradição que foi estabelecida pelos filósofos neoplatônicos e os comentadores da escola filosófica de Alexandria, que se aproximou muito do espírito Cristão, deixando de lado os interesses ontológicos e se voltando principalmente para as ciências, em especial às matemáticas. Assim, nós podemos explicar, como veremos, porque Philoponus se converteu ao cristianismo.
Após os discípulos de Philoponus, a tradição de comentadores de Aristóteles em Bizâncio chegou ao fim após três séculos. Estes foram os séculos durante os quais o pensamento bizantino voltou-se quase exclusivamente para questões teológicas. Com Psellos no século XI, uma grande linha de comentadores reemergiu quase próximo a Scholarios, o primeiro patriarca da ocupação turca, que foi também um importante comentador de Aristóteles. Além de Psellos e Scholarios, outros importantes comentadores nesta linha são João Ítalos, Eustratios de Nicéia, Nicéforo Blemmides e Teodoro Metochites. Com seus trabalhos, estes comentadores significativamente avançaram o estudo e entendimento do Estagirita.
Em 1882 a Academia de Berlim começou a publicar todos os trabalhos dos comentadores de Aristóteles, em uma ordenação impressionante de largo volume, os quais estão sendo publicados até agora,o que, no entanto, não esgota todos os comentários a Aristóteles. Mas esta edição constitui um trabalho monumental. Ela esconde em suas páginas um labor de 15 séculos, uma inimaginável riqueza de perspectivas, nuances, pesquisas, problemas, os quais, como dissemos, não olham apenas para a descoberta do correto entendimento de Aristóteles, mas também pela busca do que é certo em si mesmo.
Nós agora passaremos para alguns expoentes representativos da filosofia bizantina e procuraremos neles os elementos que expressam o significado, que Platão e Aristóteles lhes havia dado, assim como o movimento filosófico original que começara com eles.

2) João Philoponus, O Gramático --> Nossa primeira parada para aquele que nos referimos a pouco, a saber, João Philoponus, o Gramático (século VI), um homem sábio, um pagão de Alexandria, um discípulo de Amônio Hermias (o conhecido comentador do Organon de Aristóteles e discípulo de Proclus) que se converteu ao cristianismo.
Philoponus foi um homem com intenso interesse científico e continuou sua investigação e estudo ao longo de sua vida. Muitas de suas visões sobre física e especialmente sua teoria do movimento foram adotados após muitos séculos no Ocidente e causaram grande rebuliço no tempo da Renascença. Assim, alguns de seus trabalhos que se referiam às ciências positivas (geografia, física, etc) foram livros textos em Bizâncio, mas também no Ocidente no século XVIII. Ao mesmo tempo, os Neoplatônicos após Plotino, como Proclus e Jâmblico, aceitaram em suas vidas toda forma de magia e de médiuns. Eles se viam mais como sacerdotes devotos, teólogos, do que como filósofos. Pareceu que esta atmosfera pagã aborreceu Philoponus, convertendo-o ao cristianismo. Isto quer dizer que a Cristandade lhe ofereceu um fundamento mais firme tanto para o pensamento filosófico quanto para o científico. Em outras palavras, isto provavelmente quis significar que as posições metafísicas da Cristandade lhe ofereceram um Universo que lhe respondia mais adequadamente às demandas do pensamento racional. Estas coisas pressupõe, claro, que Philoponus, como Cristão, sentiu-se livre para buscar entender a conexão racional que é para ser encontrada ma esfera inerente do pensamento sensível.
Estas visões, que são de grande interesse para nós, são principalmente encontradas em dois grandes livros que são ao mesmo tempo tanto filosóficos quanto teológicos, Sobre a eternidade do Mundo e sobre A Criação do Mundo. O primeiro constitui uma refutação muito importante das visões de Proclus, que apresentara como argumentos a posição pagã da filosofia. Nós apreciamos neste trabalho o livre movimento da razão que retira seus argumentos da região da ciência e não da teologia. Aqui, ouvimos falando o sábio físico. Com profundidade, porém, vemos que ele é guiado pela fé no relato do Gênesis do Antigo Testamento, ainda que ele deseje que seus argumentos sejam científicos e sejam livremente derivados do que parece ser geralmente aceitável e racional. O segundo trabalho desenvolve a posição cristã acerca da criação do mundo.

3) O entendimento cristão de Philoponos acerca da Criação- Nós nos restringiremos a poucos argumentos característicos de Philoponos. Se o mundo fosse eterno, ele diz, então o infinito seria em ato, estaríamos em condições de dar um número a ele, o que é impossível. Isto significa que a eternidade do mundo é uma tese impossível. Novamente, ele não concorda com Proclus que toda forma de energia, e disso a criação, pode ser reconhecida como um movimento. A criação ocorre apenas pela vontade de Deus, a qual não precisa nem de tempo ou dimensão para ser expressa. Com a criação, vista neste sentido, apenas a operação espiritual, diz Philoponus, lhe é necessária, já que a última é sem tempo e não pode ser entendida como um movimento. Esta é uma distinção muito significante, que nos remove da dominação das visões naturalistas da cosmologia. A criação, obviamente, ocorre no tempo e assim o próprio tempo tem um começo.
Isto, porém, não significa que o que quer que aconteça no tempo tem seu ser imerso em um eterno devir. O triângulo toma seu início em uma certa alma - diremos a alma de Platão- mas ele não é alterado por conta disso. Ele permanece um triângulo eterno e seus três ângulos terão uma soma eterna de dois ângulos retos. Logo, não é certo que o que quer que comece no tempo é por esta razão sujeito a uma transformação incessante e mudança. Novamente, não é certo que o que quer que comece necessite algum tipo de matéria de modo a vir a ser, ou o que é necessário vir a ser de um ser pre-existente, de acordo com um princípio aristotélico de que homem gera homem, pois é possível que algo seja criado do nada. De modo similar, não é possível para a matéria existir sem um eidos, sendo sem uma qualidade, como defende a metafísica aristotélica. Em reconhecimento da alma, sua essência não é um princípio de movimento, como alega Aristóteles. O sol ilumina por sua própria natureza à medida em que manifesta, e ele projeta calor ainda que não haja vontade para isto. Nós devemos usar pensamentos similares no que concerne à alma racional, já que o que quer que aconteça, ela causa, por sua própria natureza, vida e movimento sem que necessite vontade.
Todas estas posições opostas a Philoponus são posições aristotélicas cruciais. Suas refutações alteram uma mui consistente aplicação do princípio metodológico aristotélico, que busca a cada substrato e ser sua qualidade própria. Assim Philoponus consegue escapar das garras da psicofísica de Aristóteles, que muitas vezes sujeita os fenômenos físicos e a própria alma às categorias naturais que os definem como "uma primeira enteléquia de um corpo natural que tem a possibilidade de vida" e permanece crente ao dualismo Cristão, que se expressou pela primeira vez em Platão. Retornando, em seu segundo trabalho, com relação à alma, Philoponus defende que sua substância incorpórea é introduzida no corpo humano de fora, no momento em que o corpo é formado. Deus, ele diz, abençoou o homem assim que o fez. A entrada da alma no corpo, ele conclui, não é uma privação, como Platão pensou. Aqui vemos a Cristandade falando, já que ele vê com olhos otimistas o destino do homem. O homem, ele diz, quando ganha a consciência de sua espiritualidade, torna-se ao mesmo tempo capaz de elevar a si mesmo a Deus com seu espírito e com sua alma purificada.

4) Os pensamentos de Philoponus e Aristóteles -- Ainda que muito frequentemente em suas investigações científicas ele nos lembre Aristóteles, no sentido em que ele investiga os problemas e na metodologia que ele emprega para fazer isso, Philoponus afasta-se novamente de Aristóteles em pontos cruciais. Aristóteles defende que é possível para a mente compreender as causas, isto é, os primeiros princípios dos entes. Isto acontece quando do efeito somos elevados às causas e continuamos este processo até que cheguemos à causa primeira. Com este processo, nós também chegamos a conhecer e explicar os entes, de acordo com Aristóteles, porque ele aceita contrariamente à moderna teoria evolucionista, que o maior explica o inferior. Nesta questão crucial, Philoponus discorda radicalmente de Aristóteles. Não há caminho, ele diz, que conduza do efeito para a causa ou do fenômeno para aquilo que é. Não é dado ao homem determinar as causas e consequentemente nós conhecemos muito pouco sobre elas. Nós apenas acreditamos que as coisas foram bem ordenadas e bem criadas por Deus.
Em outras palavras, Philoponus não aceita que o conhecimento humano exaure o objeto ou que seja capaz de sozinho nos conduzir aos primeiros princípios, isto é a Deus, como defende a filosofia grega. O conhecimento humano permanece, para Philoponus, na superfície dos entes; ele não move da aparência à realidade. Este processo da aparência à realidade é possível apenas com certos dogmas que nos são dados por revelação. Quando nosso espírito conscientemente adota estes dogmas, então ele comunica em um sentido com algo que está além do que é meramente sensível.
De forma breve expusemos, pelo dito acima, a postura filosófica de Philoponus. Ele é um aristotélico ou um platônico? A resposta correta é simplesmente dizer: ele é um cristão. geralmente, porém, os estudiosos reconhecem Philoponus como um aristotélico. Alguns chegaram ao ponto de afirmar que com sua autoridade, Philoponus contribuiu para a exclusiva adoção de Aristóteles como mestre do pensamento Bizantino. Em outras palavras, ele teria feito pelo Leste o que Tomás de Aquino fez pelo Oeste. Mas veremos se isto é de fato o caso. Em sua refutação de Proclus, mostramos que Philoponus sabe igualmente bem tanto Platão quanto Aristóteles. Ele repetidamente mostra que Proclus equivocou-se ou, intencionalmente, distorceu ideias que às vezes vinham de Platão e outas vezes de Aristóteles. Mas algo que revela a boa compreensão que ele teve do pensamento destes dois gigantes filosóficos está no fato dele insistir contra os Neoplatônicos nas diferenças que os separam. Se ele frequentemente defendeu posições aristotélicas, foi mais comum ainda a rejeição de outras posturas aristotélicas. Mas ele muitas vezes também refutou Platão. Nas ideias platônicas, ele vê os pensamentos criativos de Deus, os arquétipos das coisas sensíveis, não as coisas que são realmente reais, que são separadas do Deus criador, como Platão pensa. A conclusão é que Philoponus frequentemente refuta tanto Platão e Aristóteles, mas também ele frequentemente se refere a ambos quando ele crê que possam estar certos em alguma coisa. "Você deve ver as coisas em si mesmas", ele diz a Proclus, "e não apenas as hipóteses de Platão". Esta é uma afirmação de peso que mostra que ele quer ser independente dos filósofos.
Como um sábio investigador, ou como um espírito que deseja sistematizar, ele adota a lógica aristotélica, o sentido de analisar problemas e o método de investigação que é seguido por Aristóteles; ele frequentemente aceita mesmo a física de Aristóteles. Este é seu aristotelismo. Mas contanto que seu próprio pensamento se mova para o alto e o force a ir além das coisas sensíveis e, na medida em que ele faça isso, ele se anima por alguma outra inspiração. Para poder expressar filosoficamente a verdade que é derivada da revelação, i. e. as verdades que são concernentes a Deus, à alma, á criação do mundo, ele encontra mais elementos em Platão e nos Neoplatônicos. Muitas vezes, ele diz que Platão imita Moisés, mas ele nunca diz isso de Aristóteles.


5) O aristotelismo cristão dos bizantinos- É óbvio, então, que o aristotelismo de Philoponus é restrito apenas à forma, ao vestuário do pensamento, ou a seu rearranjo para as verdades científicas e não para a metafísica da substância. Este é, de fato, o aristotelismo de muitos bizantinos. É com tais reservas, que poderemos ver a originalidade e a independência do pensamento dos bizantinos e que  podemos aceitar a afirmação de que Philoponus seja o fundador do cristianismo aristotélico.
Quase ao mesmo tempo, outro grande espírito, sobre o qual nós falamos anteriormente, Leôncios Bizantios (morto em 543), apresenta mais claramente os elementos do aristotelismo cristão. O aristotelismo lógico, as noções as quais ele adapta da metafísica cristã, permite-o analisar em detalhes e com clareza noções teológicas. Este trabalho o coloca no topo da filosofia escolástica bizantina, a qual tenta por argumentos lógicos e um procedimento científico expressar verdades cristãs.
O apogeu do Escolasticismo Bizantino, no sentido que nós temos atribuído a ele, é alcançado no oitavo século com João Damasceno (d. 749), mais do que 3 séculos antes de um movimento análogo no Ocidente. Em todo ele, encontramos a posição que Philoponus abraçou com relação a Platão e Aristóteles.
Nesta matéria particular, há uma diferença básica entre o Leste Grego e o Oeste. No primeiro, os elementos aristotélicos vêm ser adicionados à tradição filosófica que é rica no platonismo. Isto está ausente em larga medida no último. Esta é a razão de porquê no Ocidente nós virmos uma completa dominação de Aristóteles, que expressa uma posição puramente racionalista do espírito. A posição dos bizantinos, ao contrário, tem a forma que encontramos em profundidade da Ortodoxia e constitui uma síntese de racionalismo e misticismo ou contemplação, onde o racionalismo é usado por Aristóteles e o misticismo ou contemplação por Platão. Este é, de fato, o novo significado que Bizâncio dá a estes dois grandes filósofos, um significado que naturalmente não corresponde à realidade histórica. Esta é a razão de porquê nem Aristóteles ser tipicamente racionalista nem Platão ser um típico representante do misticismo.
Nós agora nos moveremos a outros que completarão nosso assunto com outros elementos interessantes ou darão uma nova forma.

6) Fócio e seu programa educacional - Durante o nono século a vida espiritual de Bizâncio é dominada pela grande personalidade de Fócio (820-891). Ele é o sábio por excelência. Sua agudeza é admirável, tanto quanto sua independência e certeza de seus julgamentos, a qual se refere a uma variedade surpreendente de assuntos e ramos científicos. Seus julgamentos, sendo sempre o fruto de cuidadosos estudos, nos concede o que é a essência das questões em poucas palavras. Para estas virtudes pessoais, Fócio é o único bizantino que pode ser comparado a Aristóteles. Ele é, como este último, um verdadeiro homem de saber universal. Nascido para ser professor, ele se dedicou com todo o seu coração em conduzir a juventude sedenta de conhecimento. Sua casa foi por muito tempo, mesmo quando ele era um Patriarca, um lugar real de estudo e leitura, onde a juventude se reunia e aprendia. Seu famoso trabalho, Myriobiblos, ou Biblioteca, que contém uma análise e afirmação de 281 trabalhos de sabedoria eclesial e secular, que eram lidos, principalmente, durante estas reuniões, testemunham o esforço educacional de Fócio. Muitos dos trabalhos que são analisados aqui não mais sobreviveram.
A posição espiritual de Fócio é caracterizada pela sua forte relação com a Antiguidade. Pela primeira vez desde o século VI, uma nova reviravolta é dada com Fócio para as questões Gregas, uma nova tentativa de estabelecer uma ligação mais estreita entre a sabedoria secular e a teologia. Com Fócio chegamos a algo a mais, para um novo elemento da vida espiritual de Bizâncio. Fócio exibe um interesse vívido pela filosofia em si mesma. Ele não a vê apenas como serva da teologia. Este interesse o conduziu a incluir nos Myriobiblos ardentes palavras em relação a Enesidemo, uma súmula das quais ele nos oferece aquelas que são a única fonte para este filósofo cético. Assumindo certas reservas, diz Fócio, os trabalhos de Enesidemo são úteis àqueles que se aplicam aos estudos dialéticos.

7) Fócio e o conflito entre Nominalismo e Realismo- A despeito de sua independência de espírito, Fócio, obviamente, não cessa de ser representativo desta época. Como transparece dos seus trabalhos filosóficos que sobreviveram (muitos deles foram perdidos), o que parece ser seu interesse primário parece ser a dialética e a lógica, que, como ele diz, são sempre fundadas nos espaços da teologia.Nós devemos encerrar em um ponto, que parece ser de grande interesse para a história da filosofia. É geralmente aceite que realismo e nominalismo nasceram e se desenvolveram na filosofia ocidental escolástica. Estes temas, de fato, dividiram os escolásticos em dois campos opostos e os conduziram a vívidas justaposições de opiniões e movimentos. De acordo com o realismo, como é bem sabido, as mais altas espécies existem independentemente dos seres particulares com os quais parecem. Nominalismo estabelece contra esta visão, a ideia de que elas seriam meramente símbolos, ou palavras. A filosofia de Fócio prova ser errônea a visão de que esta discussão nasceu no Ocidente, e que ele foi um problema recorrente e acalorado já naquela época. Falando sobre as espécies (genos) e os tipos (eidos), Fócio condena os seguidores das duas posições contrastantes, indicando suas inadequações e projetando uma solução que lhe é inteiramente própria. Espécies e tipos são corpóreas, mas não são corpos. Elas denotam a essência dos sujeitos, mas não causam sua constituição. Elas são nomes, noções apropriadas para denotar a existência específica dos sujeitos e não falta nada que não seja dados aos seres, uma vez que possuam sua essência, e que de tais coisas necessitem.
Por esta razão, Fócio rejeita as ideias platônicas. A preexistência das ideias arquetípicas especifica um criador desprovido de poder, um mero técnico. Então, não há razão real para atribuir a estas ideias arquetípicas que não são cambiantes e mutáveis na mente de Deus com seres que estão em um permanente estado de vir a ser. Fócio, ao rejeitar este duplo realismo, de Platão e dos realistas, é capaz de, por um lado, preservar intacta a onipotência de Deus e a distância entre o Criador e a criatura e, por outro lado, fazer uma síntese entre o nominalismo e o realismo. Espécies e tipos existem, eles são corpóreos, mas não são corpos.

8) A preferência de Fócio por Aristóteles. Parece, do que dissemos, que Fócio tinha preferência por Aristóteles. Ele diz que sua filosofia é mais divina, pois está baseada na necessidade de ser racional e no esforço em ser metódico. Este julgamento nos dá Fócio por inteiro. A um espírito racional, mesmo que racionalista, é natural que deva se voltar a Aristóteles, o professor e informante da técnica lógica. E é este o caso geralmente em Bizâncio. Aqueles que possuem uma tendência racionalista retornarão a Aristóteles. Isto ocorre, naturalmente, não porque o pensamento de Platão não siga um procedimento logicamente necessário, mas porque Platão é mal interpretado. Eles são enganados pelas formas literárias de suas obras, especialmente os mitos contidos nelas. Estes mitos os impedem de ver o pensamento platônico em sua profundidade. Assim Fócio, uma mente prática, não faz concessões à linguagem poética de Platão, o qual ele vê primariamente como um filósofo de mitos, do Timeu, o Platão dos Neoplatônicos. Este é o Platão que nós vemos em toda a extensão da Idade Média. Mesmo na Idade Moderna foi consideravelmente tardio um conhecimento objetivamente satisfatório de Platão.

9) O retorno de Platão no século XI. A filosofia será vista com muito maior independência do que aquela de Fócio no século XI por Psellos e seu discípulo João Ítalos, mas não através de Aristóteles, mas através de Platão. Este é o significado que Platão começará a adquirir em Bizâncio. Ele tornou-se o principal representante da filosofia. Pouco a pouco, um desejo pelo platonismo foi despontando de forma autônoma e independente em seu pensamento.  No final com Platão, o pensador platônico parecerá ser o maior inimigo da cristandade. Por outro lado, o pensamento aristotélico nunca adquirirá tal significado. O pensamento aristotélico sempre parecerá aquele que herda argumentos racionais de Aristóteles para melhor estabelecimento da cristandade. Este é o estranho desenvolvimento que observamos. Platão, a quem o filósofo anticristão Nietzsche chama de subcristão é visto então depois como um inimigo irreconciliável da cristandade e o principal representante do espírito pagão grego, exatamente da mesma maneira que foram vistos Plutarco e Plotino. Aristóteles também é visto como alheio à cristandade. Aristóteles fornece as armas da lógica e oferece as interpretações dos fenômenos naturais, enquanto Platão fornece as coisas que jazem para além dos sentidos com muitas soluções muito diferentes daquelas dadas pelos cristãos e, com as perspectivas que ele inaugura, conduz a mente a um livre movimento. Em qualquer caso, é fato que durante os últimos anos de Bizâncio, o apelo a Platão é feito apenas por aqueles que desejam quebrar a síntese elaborada entre fé e conhecimento realizada pelos primeiros pais.


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